Uso de pulseiras eletrónicas aumentou cerca de 125%. Mais de dois mil arguidos evitaram prisão 

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Uso de pulseiras eletrónicas aumentou cerca de 125%. Mais de dois mil arguidos evitaram prisão
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Uso de pulseiras eletrónicas aumentou cerca de 125%. Mais de dois mil arguidos evitaram prisão

Sérgio Figueiredo, coordenador da comissão penal e processo penal da JALP, explicou à Advocatus porque a justiça recorre ao uso de pulseiras electrónicas

 

O uso de pulseiras eletrónicas aumentou cerca de 125% entre 2015 e 2020. Ou seja: de 996 casos para 2.247 arguidos que não encarcerados. Um dos motivos prende-se com o custo que essas mesmas pulseiras têm para o Estado: passou de 44 euros para 13 euros por preso, por dia.

 

Os dados são do Ministério da Justiça que indicam, ainda assim, que o número de pedidos recebidos seja superior aos executados e que o valor tem vindo gradualmente a subir. O maior crescimento, de 35%, ocorreu no ano de 2018, devido às alterações legais que ocorreram na utilização de meios de vigilância eletrónica introduzidas em novembro de 2017.

 

“O aumento do uso das designadas pulseiras eletrónicas na sequência do regime de permanência na habilitação com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, é o resultado, sobretudo, de uma política criminal, nomeadamente com a reforma penal de 2017, voltada para um aperfeiçoamento do sistema penal no sentido de potenciar a reinserção social do arguido e/ou condenado, bem como de retirar da prisão condenados por crimes de menor gravidade”, explicou à Advocatus o advogado Dantas Rodrigues.

 

O advogado disse ainda que a pena de prisão servirá assim como ultima ratio no sistema penal, “uma tentativa de ressocializar o agente do crime”. Ainda assim, Dantas Rodrigues sublinha que a realidade patenteada nos índices de reincidência expõe um “problema estrutural na readaptação pós-prisão”. Os dados do Relatório Justiça 2015-2020 apontam ainda que a vigilância eletrónica é mais atribuída aos crimes de violência doméstica (38,1%) e a medida de vigilância eletrónica mais usada é a a de pena de prisão domiciliária (30,7%).

 

Segundo o site da Direção-Geral de Reinserção Social (DGRS), a vigilância eletrónica tem como finalidade a “fiscalização por meios de controlo à distância de uma determinada decisão penal, relativamente à presença de um vigiado na sua habitação ou quanto à sua não aproximação a um determinado local ou vítima de crime”, como a de violência doméstica. Este meio de controlo existe desde 2002, sendo que até 2004 esteve em período experimental, e a presença, ou não, de um arguido ou condenado na sua casa é monitorizada através de rádio frequência.

 

Ou seja, o arguido ou condenado transporta consigo uma pulseira eletrónica que transmite sinais em rádio frequência codificados em curtos intervalos de tempos. As medidas de vigilância são adaptadas a cada pessoa, como por exemplo as saídas da habitação e horários, sendo que as equipas de vigilância eletrónica conseguem verificar à distância se o arguido ou condenado sai ou entra em casa; danifica ou tenta danificar a pulseira eletrónica ou ainda se desliga da energia elétrica. Caso o façam, estas equipas são alertadas para poderem reagir. Vários são os casos mediáticos em que foram usadas pulseiras eletrónicas, quer em arguidos ou em condenados.

 

Exemplos disso foram Oliveira Costa, em 2009, e Duarte Lima, em 2013, no âmbito do processo BPN, o médico João Ferreira Diniz em 2014 no caso Casa Pia e Armando Vara, em 2015, no seguimento da Operação Marquês. José Sócrates recusou usar a pulseira eletrónica no âmbito do mesmo processo, preferindo continuar em prisão preventiva. Recentemente, Maria de Jesus Rendeiro, mulher de João Rendeiro, ficou em prisão domiciliária com pulseira eletrónica no âmbito da operação D’Arte Asas.

 

A juíza de instrução aplicou uma das medidas de coação mais gravosas por considerar que havia perigo de fuga, perigo de perturbação do inquérito – nomeadamente para a aquisição, conservação e veracidade da prova -, e ainda o perigo de continuação da atividade criminosa. Recorde-se que no sistema português encontram-se previstas duas medidas privativas da liberdade: a prisão preventiva e a prisão domiciliária. A prisão preventiva prevê que o arguido se encontre privado da liberdade num estabelecimento prisional e a obrigação de permanência na habitação constitui a obrigação de o mesmo permanecer em habitação, não se podendo ausentando da mesma.

 

A aplicação da prisão preventiva depende da verificação de fortes indícios da prática de crime doloso, punível com pena de prisão de máximo superior a cinco anos, e a obrigação de permanência na habitação poderá ser aplicada caso o crime doloso praticado seja punível com pena de prisão de máximo superior a três anos. Relativamente ao número de reclusos no sistema prisional, entre 2015 e 2020 a tendência é decrescente. A maior quebra verificou-se em 2020, com uma diminuição de 1.418 pessoas.

 

Esta quebra é explicada pelas medidas excecionais tomadas para proteger reclusos e funcionários das prisões de focos de infeção por Covid-19 e pelas limitações na atividade dos tribunais. Com a tendência decrescente de reclusos, também a taxa de ocupação tem vindo a descer, passando de 111,7% em 2015 para 86,8% em 2020. Enquanto medida de coação, os advogados contactados pela Advocatus consideram que o uso de vigilância eletrónica pode ser a forma mais adequada e que permite diminuir a sobrelotação dos estabelecimentos prisionais.

 

“As medidas de coação prisão preventiva e a obrigação de permanência na residência não são subsidiárias, a sua eventual aplicação tem subjacentes pressupostos distintos. De todo o modo, sempre se dirá que o mais acertado, sobretudo na fase de inquérito, é que a limitação dos direitos e liberdades do arguido, sem contender com as necessidades da investigação, seja sempre reduzida ao mínimo indispensável e, nessa perspetiva, melhor será o recurso aos meios de controlo à distância do que a prisão preventiva“, explicou Sérgio Figueiredo, coordenador da comissão penal e processo penal da JALP.

 

Ângela Cruz, vogal do Conselho Geral da Ordem dos Advogados, sublinha também que a utilização destes meios técnicos permite diminuir a sobrelotação dos estabelecimentos prisionais, “óbvia ao efeito criminógeno das prisões, possibilita ao arguido uma maior proximidade com os seus familiares, é uma solução mais económica para o Estado“.

 

O advogado Dantas Rodrigues sublinha também que é necessário ter em conta que a medida de coação é aplicada no decurso do processo penal e poderá vir a assumir “particular importância” a aplicação de verdadeiras restrições à liberdade de um presumível inocente. Entre a prisão preventiva e o uso de pulseira eletrónica, o advogado considera que “em situações semelhantes, que, porventura, poderia ser aplicada uma das duas medidas, deverá ser aplicada a obrigação de permanência na habitação, pois deverá ser aplicado o princípio da subsidiariedade da prisão preventiva“.

 

Relativamente a utilização de pulseira eletrónica ao invés da pena de prisão aquando a condenação, Dantas Rodrigues acredita que em casos de criminalidade menos gravosa, a aplicação de uma medida privativa da liberdade num estabelecimento prisional poderá ser “nefasto do ponto de vista social e até contrário às finalidades da aplicação da pena” – reintegração social do arguido/condenado.

 

“Uma vez que não se poderá ignorar o estigma do recluso, a necessidade de readaptação pós-prisão e mesmo a difícil reinserção social, a função que se pretende reintegradora da pena de prisão, poderá, pelo contrário, representar um potencial risco de reincidência face às dificuldades de readaptação e reinserção”, justifica.

 

Para Dantas Rodrigues, o futuro do sistema prisional não passa por gigantes estabelecimentos prisionais, mas por pequenos centros de detenção em que os condenados de maior perigosidade estarão detidos, com meios eletrónicos de controle, e os condenados de menor gravidade, estarão inseridos na sociedade, com meios eletrónicos de controle e rastreamento social.

 

“Em determinados casos poderá justificar-se a opção pela utilização da pulseira eletrónica. O Tribunal deverá fazer uma avaliação casuística, ponderando, além do mais, o efeito criminógeno das prisões, a inoperância de uma verdadeira reinserção social nos estabelecimentos prisionais, as condições deficientes das instalações de alguns destes estabelecimentos, dificuldades apontadas em vários relatórios e que a própria OA tem denunciado. As funções das penas podem, em muitos casos, ser melhor ou tão bem prosseguidas com a medida de OPHVE”, explicou Ângela Cruz, vogal do Conselho Geral da OA.

 

Também Sérgio Figueiredo acredita que será “sempre preferível” o uso de pulseira eletrónica, sempre que exista a “possibilidade de aplicação de uma pena que não tenha o efeito criminógeno que, infelizmente, ainda está associado ao ambiente prisional”.

 

Mas em que consiste a vigilância eletrónica?

 

Segundo o site da Direção-Geral de Reinserção Social (DGRS), a vigilância eletrónica tem como finalidade a “fiscalização por meios de controlo à distância de uma determinada decisão penal, relativamente à presença de um vigiado na sua habitação ou quanto à sua não aproximação a um determinado local ou vítima de crime”, como a de violência doméstica. Este meio de controlo existe desde 2002, sendo que até 2004 esteve em período experimental, e a presença, ou não, de um arguido ou condenado na sua casa é monitorizada através de rádio frequência.

 

Ou seja, o arguido ou condenado transporta consigo uma pulseira eletrónica que transmite sinais em rádio frequência codificados em curtos intervalos de tempos. As medidas de vigilância são adaptadas a cada pessoa, como por exemplo as saídas da habitação e horários, sendo que as equipas de vigilância eletrónica conseguem verificar à distância se o arguido ou condenado sai ou entra em casa; danifica ou tenta danificar a pulseira eletrónica ou ainda se desliga da energia elétrica.

 

Caso o façam, estas equipas são alertadas para poderem reagir. Arguidos mediáticos que usaram pulseira eletrónica Vários são os casos mediáticos em que foram usadas pulseiras eletrónicas, quer em arguidos ou em condenados. Exemplos disso foram Oliveira Costa, em 2009, e Duarte Lima, em 2013, no âmbito do processo BPN, o médico João Ferreira Diniz em 2014 no caso Casa Pia e Armando Vara, em 2015, no seguimento da Operação Marquês. José Sócrates recusou usar a pulseira eletrónica no âmbito do mesmo processo, preferindo continuar em prisão preventiva.

 

Recentemente, Maria de Jesus Rendeiro, mulher de João Rendeiro, ficou em prisão domiciliária com pulseira eletrónica no âmbito da operação D’Arte Asas. A juíza de instrução aplicou uma das medidas de coação mais gravosas por considerar que havia perigo de fuga, perigo de perturbação do inquérito – nomeadamente para a aquisição, conservação e veracidade da prova -, e ainda o perigo de continuação da atividade criminosa.

 

Recorde-se que no sistema português encontram-se previstas duas medidas privativas da liberdade: a prisão preventiva e a prisão domiciliária. A prisão preventiva prevê que o arguido se encontre privado da liberdade num estabelecimento prisional e a obrigação de permanência na habitação constitui a obrigação de o mesmo permanecer em habitação, não se podendo ausentando da mesma.

 

A aplicação da prisão preventiva depende da verificação de fortes indícios da prática de crime doloso, punível com pena de prisão de máximo superior a cinco anos, e a obrigação de permanência na habitação poderá ser aplicada caso o crime doloso praticado seja punível com pena de prisão de máximo superior a três anos. Mais pulseiras, menos sobrelotação nas prisões Relativamente ao número de reclusos no sistema prisional, entre 2015 e 2020 a tendência é decrescente. A maior quebra verificou-se em 2020, com uma diminuição de 1.418 pessoas.

 

Esta quebra é explicada pelas medidas excecionais tomadas para proteger reclusos e funcionários das prisões de focos de infeção por Covid-19 e pelas limitações na atividade dos tribunais. Com a tendência decrescente de reclusos, também a taxa de ocupação tem vindo a descer, passando de 111,7% em 2015 para 86,8% em 2020. Enquanto medida de coação, os advogados contactados pela Advocatus consideram que o uso de vigilância eletrónica pode ser a forma mais adequada e que permite diminuir a sobrelotação dos estabelecimentos prisionais.

 

“As medidas de coação prisão preventiva e a obrigação de permanência na residência não são subsidiárias, a sua eventual aplicação tem subjacentes pressupostos distintos. De todo o modo, sempre se dirá que o mais acertado, sobretudo na fase de inquérito, é que a limitação dos direitos e liberdades do arguido, sem contender com as necessidades da investigação, seja sempre reduzida ao mínimo indispensável e, nessa perspetiva, melhor será o recurso aos meios de controlo à distância do que a prisão preventiva“, explicou Sérgio Figueiredo, coordenador da comissão penal e processo penal da JALP.

 

Ângela Cruz, vogal do Conselho Geral da Ordem dos Advogados, sublinha também que a utilização destes meios técnicos permite diminuir a sobrelotação dos estabelecimentos prisionais, “óbvia ao efeito criminógeno das prisões, possibilita ao arguido uma maior proximidade com os seus familiares, é uma solução mais económica para o Estado“.

 

O advogado Dantas Rodrigues sublinha também que é necessário ter em conta que a medida de coação é aplicada no decurso do processo penal e poderá vir a assumir “particular importância” a aplicação de verdadeiras restrições à liberdade de um presumível inocente. Entre a prisão preventiva e o uso de pulseira eletrónica, o advogado considera que “em situações semelhantes, que, porventura, poderia ser aplicada uma das duas medidas, deverá ser aplicada a obrigação de permanência na habitação, pois deverá ser aplicado o princípio da subsidiariedade da prisão preventiva“.

 

Relativamente a utilização de pulseira eletrónica ao invés da pena de prisão aquando a condenação, Dantas Rodrigues acredita que em casos de criminalidade menos gravosa, a aplicação de uma medida privativa da liberdade num estabelecimento prisional poderá ser “nefasto do ponto de vista social e até contrário às finalidades da aplicação da pena” – reintegração social do arguido/condenado.

 

“Uma vez que não se poderá ignorar o estigma do recluso, a necessidade de readaptação pós-prisão e mesmo a difícil reinserção social, a função que se pretende reintegradora da pena de prisão, poderá, pelo contrário, representar um potencial risco de reincidência face às dificuldades de readaptação e reinserção”, justifica.

 

Para Dantas Rodrigues, o futuro do sistema prisional não passa por gigantes estabelecimentos prisionais, mas por pequenos centros de detenção em que os condenados de maior perigosidade estarão detidos, com meios eletrónicos de controle, e os condenados de menor gravidade, estarão inseridos na sociedade, com meios eletrónicos de controle e rastreamento social.

 

“Em determinados casos poderá justificar-se a opção pela utilização da pulseira eletrónica. O Tribunal deverá fazer uma avaliação casuística, ponderando, além do mais, o efeito criminógeno das prisões, a inoperância de uma verdadeira reinserção social nos estabelecimentos prisionais, as condições deficientes das instalações de alguns destes estabelecimentos, dificuldades apontadas em vários relatórios e que a própria OA tem denunciado. As funções das penas podem, em muitos casos, ser melhor ou tão bem prosseguidas com a medida de OPHVE”, explicou Ângela Cruz, vogal do Conselho Geral da OA.

 

Também Sérgio Figueiredo acredita que será “sempre preferível” o uso de pulseira eletrónica, sempre que exista a “possibilidade de aplicação de uma pena que não tenha o efeito criminógeno que, infelizmente, ainda está associado ao ambiente prisional”. 

 

ADVOCATUS / ECO, 2021/12/12