Com o 25 de Abril de 1974 chegou a liberdade, a liberdade de um povo, mas acima de tudo a liberdade da família e das mulheres em particular. Até que ponto, 47 anos depois, a evolução da família e alguns direitos da mulher, comparativamente com os do homem, acompanharam esta mudança é o ponto de partida para o texto da autoria de Tânia Pires.
“Foram dias foram anos a esperar por um só dia. Alegrias. Desenganos. Foi o tempo que doía com seus riscos e seus danos. Foi a noite e foi o dia na esperança de um só dia.”
Manuel Alegre.
Deus, Pátria e Família era a trilogia fascista que guiava o Estado Português até ao 25 de Abril.
Nos manuais escolares podia ler-se: “Na família, o chefe é o pai; na escola, o chefe é o mestre; na igreja, o chefe é o padre; na Nação, o chefe é o governo”.
Servindo-se da Igreja, o Estado fazia da família sua refém, impondo valores, princípios e crenças e cultivando a cultura do medo, quer por força da polícia política, quer por intermédio da censura.
Para o Estado o único modelo de família aceite era aquele que resultava do casamento, não sendo admitidos quaisquer outros modelos. E, uma vez casados catolicamente, o casamento seria indissolúvel.
No núcleo familiar, o homem era visto como o chefe de família e a figura da mulher, limitava-se ao governo doméstico. Só excecionalmente, a mulher poderia trabalhar e mesmo nesta circunstância, nalgumas situações, necessitava de autorização do marido para o efeito.
De relembrar que às mulheres estava ainda vedado o acesso a algumas carreiras, como a magistratura e a política e que o exercício de algumas profissões, como, por exemplo, a de enfermeira, implicavam limitações dos seus direitos, como o próprio direito de casar.
Como chefe de família, o homem, administrava o património, quer se tratasse de bens comuns do casal, quer se tratasse de bens próprios da mulher. De salientar que, relativamente à correspondência endereçada à mulher, ditava o Código Civil que o marido teria direito de abri-la.
Esta parece uma realidade saída de um qualquer filme com séculos de existência. Contudo, a verdade é que passaram apenas 47 anos.
Foi com o 25 de Abril de 1974 que chegou a liberdade, a liberdade de um povo, mas acima de tudo a liberdade da família e das mulheres em particular.
Legalmente, já não somos obrigados a ficar casados a vida toda, a mulher já não nasce para ser doméstica e não precisa de autorização do marido para viajar ou trabalhar seja em que área for.
O paradigma da família mudou, quer pela aceitação de outros modelos, quer pela forma como o homem e a mulher são vistos dentro da mesma.
É, porém, importante rever o passado para dar valor ao presente e lutar constantemente por um futuro melhor, mais igualitário, mais democrático e respeitador da liberdade de pensamento.
Pois, quer na família, quer na sociedade em geral ainda há caminho a traçar.
A democracia e a liberdade não se fazem num dia. O 25 de Abril foi um marco de viragem na nossa história, mas a história é aquela que continuamos a escrever todos os dias, lutando diariamente por uma sociedade melhor, para nós e para aqueles que lhe derem continuidade.
Autor: Tânia Pires, da Comissão de Família e Menores da JALP.